Em tempos de pandemia do coronavírus, a educação teve de se adaptar. Com as aulas presenciais suspensas devido ao risco de contágio — e a tendência é que não voltem antes de agosto —, a saída encontrada para não deixar os estudantes ao léu, correndo o risco de perder o ano letivo, foi ofertar aulas remotas. Recentemente o Conselho Nacional de Educação (CNE) chegou a publicar um parecer técnico reafirmando o EaD como a melhor solução para a reorganização do calendário escolar.
No entanto, ainda é expressivo o número de pessoas que não possuem acesso à internet. Dados do TIC Domicílios, divulgado na última terça-feira, mostram que, na região Sul, 25% das pessoas — uma em cada quatro, portanto — não estão conectadas. Extrapolando os números para a realidade paranaense, teríamos que 2,86 milhões de pessoas não acessam a internet no estado.
Foi com essa realidade que se deparou a professora Agnes Dissmann, que leciona nos colégios estaduais Arlinda Ferreira Creplive e André Andreatta, ambos localizados em Quatro Barras, na Região Metropolitana de Curitiba (RMC). Ela conta que nas aulas online, feitas por meio da plataforma Google Classroom, é possível visualizar quantos e quais alunos estão acompanhando o conteúdo.
“Boa parte dos estudantes, em função de variadas situações, não têm acesso à plataforma do governo para essa continuidade [dos estudos]. Tentamos ainda contato com as famílias, via WhatsApp, mas muitas não retornavam. E aí eu comecei a ficar preocupada, porque não estava chegando nada”, relata a professora.
Proativa, Agnes decidiu então fazer algo diferente. Além das aulas online, agora também está imprimindo e entregando quinzenalmente exercícios para serem feitos por aqueles estudantes que não possuem acesso ao mundo virtual, para que eles também tenham a oportunidade de prosseguir com os estudos.
“As atividades impressas são especialmente para esses estudantes que não tem o acesso às outras possibilidades, estão desfavorecidos em função disso. Dessa maneira a gente impede de deixar eles sem fazer nada”, conta a professora. “Eu me sinto bem melhor em função de possibilitar para eles esse acesso, porque eu estava me sentindo inútil na minha função. Me sinto bem mais aliviada, feliz de ter tido esse contato com eles, com as famílias”, finaliza.
‘Tá até cansado de ficar em casa’, diz mãe de aluno
De acordo com Rosiângela Luchese, diretora do Colégio Arlinda Ferreira Creplive, cerca de 80 alunos estão recebendo as atividades em casa, sendo que em alguns casos é a própria diretora ou a professora Agnes que leva as tarefas.
O perfil dos estudantes é variado, mas praticamente todos moram na área rural de Quatro Barras, o que explica a dificuldade no acesso à internet – enquanto na área urbana quase 80% da população possui conexão, na área rural o porcentual fica abaixo de 60%.
Mãe de Alessandro, aluno do segundo ano do ensino médio, dona Eva celebra que o filho possa estudar, mesmo longe da escola. “Dia a dia sem escola está ruim, ele não está fazendo nada, fica só em casa. Tá até cansado de ficar em casa, porque enjoa”, conta ela. “Ele falava para nós [da lição], mas não tem como se comunicar com a escola para pedir, nós moramos longe. Até para fazer compra é difícil”, conta.
Já Lucimar de Jesus Henemann, pai da Luana, exalta a atitude dos profissionais da educação. “Eu acho legal. Muitos alunos não tem aquela comunicação com a internet, a televisão, e acho legal eles procurarem saber dos alunos. É muito importante, porque nesse período parado muitas crianças ficam só na rua, não pegar um livro para ler”.
Diretora pede seriedade aos estudantes
A diretora Rosiângela Luchese faz ainda um apelo aos alunos do Arlinda Ferreira Creplive, explicando que a dificuldade de muitos estudantes tem sido compreender que as aulas à distância estão contando como se fossem as aulas presenciais, inclusive com avaliação de desempenho – o que pode significar reprovação lá na frente, caso o estudante não alcance as notas exigidas.
“Tem aluno que ainda não apareceu. Eu só queria que houvesse o chamamento desses estudantes, comprometimento deles em relação a isso, que comparecessem na escola, ligassem”, afirma. “Queremos eles interagindo, que tenham aprendizagem mínima. Para os alunos que estão fazendo os exercícios impressos, aumentamos o prazo de entrega, que agora é mensal, por causa da dificuldade de acesso”, explica.