Uma análise do Instituto Pensi, centro de pesquisa clínica em pediatria do Hospital Infantil Sabará, aponta que, a partir do momento em que o Brasil tiver 50 casos confirmados de coronavírus, o país poderá chegar a mais de 4.000 casos em 15 dias e cerca de 30 mil casos em 21 dias.
O país passou dos 50 casos confirmados nesta quarta (11), segundo o Ministério da Saúde, e chegou aos 69.
Além disso, considerando a quantidade de casos graves e críticos na China e os períodos de internação desses casos (7 e 14 dias, respectivamente), o Brasil poderá precisar de cerca de 2.100 leitos hospitalares, dos quais cerca de 525 em UTI (unidades de Terapia Intensiva) apenas nos primeiros 21 dias, após o 50º caso.
A análise mostra que, a partir de 50 casos, Coreia do Sul, Irã e Itália tiveram evoluções surpreendentemente semelhantes. Além disso, países como França, Alemanha e Espanha parecem mostrar evolução semelhante à tríade Coreia do Sul, Itália e Irã.
“O grande desafio é a velocidade com que o novo coronavirus-19 se espalha e gera pacientes graves”, diz a análise. Isso leva os sistemas de saúde a receber uma demanda muito acima de sua capacidade de atendê-la adequadamente.
A partir do número inicial de infectados, o incremento diário do modelo é de cerca de 37% de novos infectados. Crescer o contingente de doentes a essa taxa equivale a quase decuplicar o montante a cada semana.
O documento técnico foi elaborado para contribuir para a análise e a ponderação de medidas e ações apropriadas no enfrentamento das consequências de um possível aumento significativo de casos no Brasil nas próximas semanas.
Em pouco mais de dois meses de evolução, o novo coronavírus infectou mais de 100 mil pessoas em todos os continentes, matou cerca de 4.000 e mostra franca e vigorosa expansão fora da China.
Segundo o documento, o cenário e os riscos atuais exigem respostas rápidas e coordenada dos sistemas público e privado de saúde por meio de processos que suportam cooperação mútua.
Yussif Ali Mere Junior, presidente da Fehoesp (federação dos hospitais, clínica e laboratórios do estado de São Paulo), diz que não é possível dizer que a rede hospitalar está preparada para um aumento rápido de internações. “Se vier na mesma intensidade da China ou da Itália, será muito complicado.”
No entanto, ele afirma que na rede privada há uma ociosidade de 30% de leitos que poderá ser usada para suprir as necessidades emergenciais. A sobra é resultado da crise econômica e do desemprego que levaram mais de 3 milhões de pessoas a perder seus planos de saúde.
Mas a grande preocupação, segundo ele, é com a oferta de leitos de isolamento em UTIs. Os hospitais paulistas só dispõem de 40 deles, segundo ele.
Na sua opinião, o caminho será o estado reservar alguns hospitais exclusivamente para o atendimento das vítimas graves do coronavírus, medida que já está sendo estudada.
“É fundamental que os setores público e privado estejam alinhados nesse momento, todo mundo do mesmo lado”, afirma.
Para o economista Rudi Rocha, pesquisador do Instituto de Estudos para Políticas de Saúde, iniciativa capitaneada pelo economista Armínio Fraga, o sistema de saúde será ‘supertestado’, e a linha de base não é nada otimista.
“Mais do que nunca vamos precisar de coordenação entre as regionais, articulação entre os entes da federação e, eventualmente, entre o público e o privado. Tudo o que a gente sempre precisou agora vai ficar muito evidente. Ou a gente corre ou, se a situação se agravar, as consequências podem ser bem severas.”
Segundo ele, a restrição de recursos públicos também é outro fator preocupante. “Tem alguma margem, onde a gente consegue liberar recursos extraordinários. Em um primeiro momento, eles podem ser usados para cobrir, por exemplo, aumento de internações ou da demanda por medicamentos.”
Em participação de audiência na Câmara dos Deputados, em Brasília (DF), o ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, disse que negocia com o Legislativo uma liberação de até R$ 5 bilhões para ações de enfrentamento ao coronavírus.
O recurso viria de emendas da relatoria da casa e será utilizado na atenção primária e hospitalar para reforçar as ações contra o vírus.
Segundo Mario Scheffer, professor de saúde preventiva da USP, por enquanto é difícil calcular a oferta necessária de leitos hospitalares ou médicos, por exemplo, porque ainda não estão claras as demandas e as necessidades.
O próprio mapeamento desses recursos no Brasil é impreciso. Por exemplo: país tem um total de 410.225 leitos públicos e privados, mas não se sabe quantos seria adequados para receber pessoas infectadas por coronavírus.
A oferta de médicos também é incerta. O país tem 452.801 profissionais mas não há informações precisas sobre o local de trabalho de cada um. “É algo dinâmico, os vínculos de trabalho são múltiplos, varia conforme a região, especialidade, setor público e privado”, diz Scheffer.